7 de julho de 2010

Três de Novembro




Copo atrás de copo chega-se a beber uma garrafa de vinho inteira. Como um nobre escudeiro pretendo sacar a espada e com um só golpe libertar meu príncipe do horroroso suplício de uma vida que outra coisa não é senão a morte prolongada. Depois enviar minha alma ao encontro desse semideus libertador!


O homem é tão efêmero que mesmo onde está verdadeiramente seguro da sua existência, no único lugar em que sua presença produz uma impressão real, ou seja, na saudade e no coração daqueles que lhe são caros, mesmo aí deve apagar-se e desaparecer o mais depressa possível!


Quantas vezes tive vontade de rasgar o peito e estourar o crânio vendo que somos tão pouca coisa uns para os outros! Só de mim depende o que trago de amor, alegria, calor e embriaguez. Se ele permanece frio e sem força diante de mim, mesmo o coração transbordando de felicidade, não poderei fazer feliz esse outrem.


Vós sabeis o que se sente ao ver tantas seduções sem ter-se o direito de estender a mão e agarrar tudo o que nos fere os sentidos? Tenho-a toda em mim e o sentimento que experimento por ela absorve tudo. Tenho-a toda em mim e sem ela tudo é para mim como se não existisse. Deus todo-poderoso, já estive cem vezes para atirar-me ao seu pescoço!


Só Deus sabe quantas vezes mergulho no sono com a esperança de nunca mais despertar; e pela manhã, quando arregalo os olhos e torno a ver o sol, sinto-me profundamente infeliz. Se eu pudesse mudar de humor, entregar-me ao tempo e ao insucesso de uma iniciativa qualquer, ao menos o fardo dos meus aborrecimentos não pesaria tanto. Não sou culpado, mas é em mim que está à fonte de todos os meus males como outrora a de toda a felicidade.


Não sou mais o homem que nadava num mar de rosas e a cada passo via surgir um paraíso cujo amor era capaz de abranger o mundo inteiro. O coração que assim pulsava está morto, não produz mais os arrebatamentos de outros tempos. Aumenta o meu sofrimento verificar que perdi aquilo que fazia o encanto da minha vida: sagrada e tumultuosa força graças à qual podia criar mundos e mundos em torno de mim. Essa força não mais existe! A natureza me parece fria e inanimada como uma estampa colorida. Todos esses encantos não me podem fazer subir do coração ao cérebro a menor sensação de felicidade, e todo o meu ser permanece como uma fonte estancada, como uma cânfora vazia!


Se sobre a cabeça o céu é de bronze e em torno a terra estala de sede, quantas vezes caí de joelhos sobre a terra implorando algumas lágrimas como um semeador implora a chuva? Mas não é a impetuosidade das nossas preces que fará com que Deus nos conceda. E os tempos de que sinto uma torturante saudade só eram felizes porque eu confiava no seu espírito e recebia de todo coração, com um vivo reconhecimento, as delícias que Ele derramava.

Ricardo Magno

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