9 de julho de 2010

Iambo

Com um buraco interior do tamanho de Deus que denuncia uma natureza bondosa e honesta; sem ter o que comer, agora é o verme do consumismo o ser que me consome. Morro mendigo mas sem pedir nenhuma esmola. O que passou nunca mais irá acontecer enquanto continuo lamentando pelas coisas que não existem mais.


Numa fase de aprendizado não há como esconder as derrotas. E é através de uma sílaba breve acompanhada de outra longa que vou me tornando mais humanizado. Mas se não houver mão em mim, é com a minha própria dor que serei bem capaz de entoar toda uma litania de antíteses.


Não gosto de gastar palavras sobre assuntos em que cada um é tão ignorante quanto eu. Qual é o destino do homem senão suportar a parte de sofrimento que lhe toca, tragar seu fel até a última gota? E, se o cálice pareceu demasiadamente amargo aos lábios humanos do Deus celestial, por que me farei eu mais forte do que na realidade sou fingindo achá-lo doce? E por que envergonhar-me no terrível momento em que todo o meu ser estremece entre a vida e o nada; e o passado, como um clarão, ilumina os tenebrosos abismos do futuro, e tudo em torno de mim se despedaça, e o mundo inteiro soçobra comigo? Meu Deus, meu Deus, por que me abandonastes? Poderei envergonhar-me destas palavras e recuar de medo ante o momento do qual não escapou aquele que se envolve nos céus como num manto?


Ele refugiou-se no seu cravo, dissimulou com o seu jogo de notas harmoniosas, fazendo-as acompanhar da sua voz suave e murmurejante como o leve perpassar do vento. Às vezes, digo a mim mesmo: Meu destino é sem exemplo; e se ninguém foi mais torturado do que eu, posso até estimar aqueles que são felizes. Depois, leio qualquer poeta de tempos idos parecendo que lanço um olhar para dentro do meu próprio coração.




Ricardo Magno

0 Comentários: