19 de julho de 2010

Caminhada

Após mais uma tarde perdida em meio a divagações desiludidas, percebo que a melhor matéria seria o próprio jornal. É que a mancha gráfica por si só já fala. Então me despedi do meu primo e logo me perdi no caminho de casa em meio a neblina fumacenta do cigarro que eu mesmo queimava, pois se o combustível acaba, no caminho mesmo eu faria minha morada.

Acabará de chuviscar. Há algum tempinho já é passado das 20 horas enquanto eu ando e apenas tento descobrir um jeito de aproximar o novo jornalismo da minha realidade, pois Imperatriz é um cú e vive numa outra dimensão bem distante disso. Da casa da minha tia em diante, sigo pela calçada suja, molhada e desnivelada da rua Amazonas e viro a direita na primeira esquina. Logo sinto bater o coração da casa. E a cada passo que dou os pensamentos entram em conflito com as palavras até um fazer do outro sua morada. 

A cada passo que dou a alma se digladia com o corpo até alguém conseguir provar quem é que manda na casa. De longe, já acostumado com esse processo, continuo andando porque sei que o importante é nunca parar. De longe acostumado com esse processo, sei que é assim a mecânica do berçário de minha morada.
Da Bernado Sayão em diante, passam dezenas de carro enquanto absorto não vejo quase nada. Da Bernardo Sayão em diante, acontecem milhares de coisas enquanto eu só vejo karmas. Um felling muito aguçado pra quem ainda não bebeu nada. Porque as ruas que cortam umas as outras também cortam minha alma.

Na sorveteria em plena sexta-feira da noite, duas garotas e um rapaz. Uma sendo mais bela que a outra, provavelmente seja ele quem esteja pagando a rodada, porque algumas coisas mudam enquanto outras são sempre iguais.

Ao caminhar em frente ao Estádio, percebo que meus passos alternados ferem e curam minha alma. Este é o sinal mais iminente de que o processo fora iniciado. E por todas as esquinas que passo, um maldito carro interrompe meu tráfego. Por todos os sinais que cruzo é a luz vermelha que está ligada. Mais uma anunciação sem significado. Só que, enquanto cruzo a Luis Domingues em sentido a Coriolano Milhomem, vejo um golf preto todo “fumezado” no sinal quase que parado. Há! Há essa hora, em plena sexta-feira, provavelmente o cara deve estar indo pra raparigada.

Num chão todo desnivelado, a mais de dois quarteirões não ando na calçada e logo que retorno pra rua, meu pé esquerdo sobre-salta por duas pedras abandonas: meu corpo e minha alma, duas pedras abandonadas! Motos pretas, motos cinzas, um arco-íris de fazer nada a medida que uma moto se aproxima do orelhão da calçada em plena sexta-feira do nada, provavelmente o cara não ligará para a amada. Daí percebo que hoje não é um bom dia pra escrever porque mal consigo terminar uma palavra. Mas continuo porque o importante é não parar e tudo o que deixo pra fazer depois nunca faço.

Eu vejo tudo, tudo me cerca, mas eu não vejo nada! No sinal que me pára, fico com medo de perder as idéias. No meio da Benedito Leite, no translado da Coriolano, vejo o semáforo fechado dela com a Simplicio e um caminhão estacionado como quem não quer nada. Mais ao longe, duas quadras daqui, uma moto passa perpendicularmente e quase que se mata. Mas é só ao chegar em casa é que fecho o desfecho de minha cruzada. Da casa do meu primo até a minha rompi o espaço e o tempo, arrebentei a teoria das cordas e acabei dando a volta no mundo perdido por entre os átomos da alma.

Ultrapassei o bar da esquina, desviei de três sacos de lixo na calçada pra saber que a luz do banheiro tinha sido queimada e hoje a punheta seria no escuro ou a luz de velas.

Ricardo Magno

0 Comentários: