12 de setembro de 2012

Farra Velha






Em logradouros públicos não havia saneamento básico. As principais vias da cidade não tinham identificação e nem pavimentação asfáltica. Sem ajuda de Plano Diretor, os primeiros lojistas que chegaram começavam a se organizar em um calçadão de bloquetes. Logo ele viria a ser a central nervosa dos comerciários.

Perto do que seria uma das universidades, homens fedidos com cheiro de ouro tomavam cachaça enquanto as mulheres davam aulas. Os açougueiros da alma, naquele tempo, acordavam mais cedo. Farra Velha era a economia dos prostíbulos, a maior economia da época. Lixos em volta de bares, moscas em volta de bêbados, esse era o fluxo monetário.

Em uma rua chamada desejo, no cortiço, o complexo de cabarés, Vaca Velha era o nome da puta louca que ficou doida só de morar lá. Rita Faceira enganava a pistolagem de uns garimpeiros bestas com uma máscara de rígida moral paladina.

O lar era de infiéis à moda antiga e modernos. Casais antiquados e contemporâneos, ambos podiam fazer a felicidade. Mas muitos não gostavam de estar ali. Atrás de um matagal onde hoje é o centro da cidade, segredos se escondiam por detrás do sol da tarde. A pisar em cacos, meninos caçavam calangos no quintal da fábrica. Baladeira era o nome do relógio!

Os aposentos eram imundos, as pessoas simplórias. Doenças venéreas corroíam os hospedeiros por dentro, camisinha era um codinome para pele de carneiro. Todos indigentes! Uns mais inóspitos do que outros. Exceto eles, ninguém ia lá. As mulheres quando tinham gosto, era muito mau. Péssimo! Os homens eram dejetos de cabras. Feições sujas, cutes embarbada esfumaçadas de caipora, odor pesado.

O sexo era macrobiótico com milhões de fungos e bactérias. Lavam-se as mãos e sujavam as partes. Assim é que era esse incessante ciclo de barbárie e falta de higiene estúpida. E se fugisse um ladrão, ele se esconderia lá. Pois lá se encontrava a maior compilação de todos os filhos da puta da humanidade. Os que ainda estão vivos, os que já morreram e, principalmente, os que estão por vir. Todos são filhos da mesma mãe: A marginalidade!

Longas e irônicas gargalhadas davam as boas vindas para quem chegava. E para acabar com a algazarra, chamaram os delegados de outros estados e puseram a regional, estrategicamente, no coração do antro. HÁ, HÁ, HÁ!!! Só que esses caras eram mais putos do que aquelas que davam. Davam a dignidade, o escrúpulo, o orgulho próprio... E, ao extremo, como tinha de ser com todo porco e porca dos cortiços; davam por pechincha, em pratos frios, como refeição principal, a própria vida.

No final do dia as garrafas de pinga sempre ficavam vazias. Restava somente as cascas de frutas e os animais peçonhentos curtidos. ‘Plebeus conterrâneos’andavam de bicicleta. Os ‘burgueses’, filhos de ‘burgueses’, estudavam fora. E tudo aquilo, toda a representação econômica e sociocultural daquela época era um imenso soco na cara. Porque se tudo o que existe, para que exista é necessário acreditar... Então não existe nada. Com uma única e exclusiva exceção para a Panelada.



Heitor Monte Cristo

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