27 de setembro de 2010

Mártir





A sarjeta escorre o esgoto para qualquer lugar. E de nada adianta ficar sentado na calçada observando o destino se manifestar. Jogar não é a mesma coisa que estar no jogo.

Dia após dia, com o papel e a caneta, com as atitudes e o caráter vou escrevendo e construindo histórias novas com a ajuda das velhas. Vou escrevendo e construindo coisas novas sobre as velhas.

Se não fosse pela memória, o passado não me faria a menor falta. Pois é sempre no presente que encontro a junção de todos os tempos. O presente é um momento eterno. Quanto a isso, prefiro não ser presenteado.

Tenho apego mais ao sentimento do que as pessoas por quem sinto. Pois a areia é muito mais valiosa do que qualquer caríssimo jarro de vidro. E prefiro cantar sozinho para que ninguém ouça minha felicidade.

Todas as minhas metas e tudo o que de mais belo carrego dentro de mim pertencem a uma dimensão espiritual. Por isso, poucas pessoas são capazes de entender até que eu transforme o anímico em sólido.

Vez por outra, algumas coisas me abatem enquanto em outras sou eu que dou um soco forte. E eu bato com tanta intensidade até deixar em pedaços. 

Por onde passo, vou adulterando dados, invertendo pólos e canalizando energia. Obtenho a maior tranqüilidade ao fazer tudo isso. 

A minha existência deixou de ser somente minha quando eu alcancei o limiar do plano e comecei a viver pela existência dos outros. Deixei de ter uma vida e passei adquirir a vida dos humanos.

Enquanto meus pais apenas desejam que eu estude, trabalhe e case; não faço a menor idéia do que poderá acontecer quando a profecia se fazer e o destino se cumprir para eu vir a me tornar quem meu eu de verdade.

Minha mãe tem medo do designo. Ela sente calafrios de pavor só de imaginar a promessa se cumprindo enquanto ela perde o filho para o surgimento de um mártir. 

Mas eu entendo ela. De maneira informal consigo auscultar o seu temeroso coração. Por isso, durante a noite, sempre me deito na presença dos anjos, e durante o dia explico toda a conversa para ela.



Ricardo Magno

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